sábado, 3 de dezembro de 2011

os meus salmos

escrevo dentro da chuva que me cospe palavras roucas em vestidos de algodão. visto esta rouquidão de poucos meses. gravito sobre as águas marginais do santo batismo e pela cabeça de são joão batista que salomé tanto se ocupou. me refresco entre a chuva que se veste na rua. respiro a água e o meu filho de sangue que por hora é a minha melhor invenção. te escuto na chuva em que me beira todos os lares já visitados. para que assim também eu possa pedir que me conceda, uma vez na vida, todo o mar da tolerância. todo um céu de boas aventuranças. não me julgues santo, pois dele já me desfiz faz tempo. sou aquele filho da mãe que dá sinais de rio quando o mar se enforca em lagoas. assumo a proa da vida para dar sinais de que o homem também pode dar sentido em sua embarcação. por hora, esta chuva me basta. este pano de algodão me protege e encharca de toda e qualquer mansidão. estou jogado frente ao estado das coisas cruas. sou forjado dentre o aço da estética e do amor. sou meu santo. meu guia. sou meu tudo o que posso inventar. sou tua pele. sou teu riso. sou teu mal. mas tem deus que me olha e desconfia da salomé que te rodopia. vem, pois o amor é liberto. pois venha, que a calma já não existe mais. que a chuva arrebentou com a minha vazão. não bastou represa-la. sou cadente neste mundo de pão e água, no qual a bondade se apropriou indevidamente. divido-os contigo, meu irmão. divido a carne do pão e a carne da carne. assim me alimento de água e vinho no cemitério de salomão.

2 comentários:

Luís Filipe disse...

Muito bonito! Outro clima!

Gil Maulin disse...

sempre gostei dos salmos.